Mesmo em meio à seca, o mercado cearense de leite enfrenta uma crise de superabastecimento, que tem reduzido os ganhos dos produtores e da indústria que beneficia o alimento. O consumidor viu o preço nas gôndolas de supermercado cair em mais de 36% no último ano, saindo do patamar de R$ 3 para R$ 1,90. Os empresários do setor local já chegaram a estocar cerca de 600 mil litros de leite processado na tentativa de controlar os preços. A “reserva técnica” estratégica em períodos normais é de cerca de 30 a 40 mil litros.
Para proteger o mercado local, representantes da cadeia produtiva querem que o Estado sobretaxe os laticínios vindo de outros estados. Hoje, haverá uma reunião na Secretaria da Fazenda (Sefaz) para discutir os pleitos. Aumento da produção local, acomodação e redução do mercado e vinda de produtos de outros estados a preços competitivos são causas apontados.
Entre as propostas está o aumento da taxação sobre o leite longa vida que vem de outros estados, em especial Minas Gerais, Goiás e Rio Grande do Sul. Já existe uma taxa cobrada de R$ 0,3 para cada litro de leite vindo de fora, além de uma alíquota de 17% destinada a todo o mercado. A proposta é que esse valor seja elevado a R$ 0,45 o litro. Além disso, há o pleito de isenção de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para produtos como o queijo muçarela que sejam produzidos no Estado. Hoje o alimento é quase totalmente importado.
O diretor de Agronegócio da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), Reginaldo Lobo, disse que existe a possibilidade de dumping, uma prática comercial na qual empresas de outros estados vendem seus produtos abaixo do valor de mercado para quebrar os concorrentes locais e dominar o mercado. “Avançamos porque houve uma avalanche de leite no Ceará. Não achamos justo porque o mercado deles é protegido”, defendeu Reginaldo Lobo.
Agamenon Coutinho, representante das cooperativas de laticínios do Ceará na Câmara Setorial de Leite, acrescentou que já vêm sendo investigadas empresas que possuem filiais no Ceará e que podem estar sonegando impostos com a justificativa de estarem produzindo no Ceará. Já foi denunciada uma empresa com sede em Pernambuco e filial no Ceará.
Preço ao produtor
Para seguirem competitivas, as indústrias locais reduziram os preços aos produtores. Enquanto em abril do ano passado, o valor pago ao produtor alcançava R$ 1,10 o litro de leite, em novembro já havia regiões pagando menos de R$ 0,80 pelo litro, segundo dados do Centro de Estudos em Economia Aplicada (Cepea).
“Está sobrando leite no Brasil todo”, ressaltou Henrique Girão Prata, presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados no Ceará (Sindilaticínios). Ele destacou que há mais de 50 indústrias legalizadas no Ceará Se contar as pequenas fabricantes de queijo, esse número passa de 100.
Depois de beneficiado, o leite longa vida tem validade média de 120 dias. Para controlar preços e evitar superoferta, os empresários fazem reserva técnica. Mas isso não tem sido suficiente. “Temos que vender nos primeiros 30 dias para o supermercado. Se passar dos 60 dias, o supermercado não compra”, destacou Agamenon Coutinho.
O consumo de leite no Brasil cresceu 25%, passando de 142 litros/ano por habitante em 2008 para 178 litros/ano em 2014, segundo o Sebrae.
Em relação ao queijo de coalho, o Ceará é forte produtor. O preço médio é de R$ 12 a R$ 14 o quilo para os produtos não certificados. Nos supermercados, os queijos certificados custam em média R$ 20.
O programa Leite Ceará, que existe desde maio de 2014, é demanda da cadeia produtiva. O objetivo é aumentar a produção de leite a partir de melhoramento genético e segurança alimentar dos animais.
Uma das soluções para a competitividade e para remunerar melhor o produtor é aumentar o mix de produtos. Deve ser concluído até o final de março o projeto para instalação de uma fábrica de leite em pó no Ceará. Ainda serão definidos critérios como localização e investimento.