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domingo, 12 de julho de 2020

TRE-CE dobra o número de cassações de prefeitos eleitos em 2016; Veja lista dos municípios

A Justiça Eleitoral do Ceará cassou dez chapas eleitas, em 2016, para governar os municípios do Estado. As sentenças foram mais do que o dobro dos casos que atingiram os eleitos quatro anos antes, em 2012: apenas quatro.

Dos gestores municipais cassados no atual mandato, oito foram por abuso de poder político, econômico ou dos meios de comunicação, um por compra de votos e um por rejeição de contas.

No mandato anterior foram três por abuso de poder político e econômico e um por rejeição de contas.

As informações foram levantadas a partir de solicitação feita pelo Diário do Nordeste ao Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) através da Lei de Acesso à Informação.

Das dez cassações, uma, no entanto, do município de Penaforte, segue suspensa desde abril deste ano por decisão do próprio TRE-CE. A Corte vai julgar os embargos de declaração, uma espécie de recurso protocolar. O procedimento deve ser encerrado com o término das medidas estaduais de combate à pandemia da Covid-19.

Para o presidente da Corte Eleitoral, desembargador Haroldo Máximo, o crescimento no número de cassações de prefeitos e prefeitas no Ceará tem relação direta com o amadurecimento da Lei da Ficha Limpa, que completou dez anos em 2020.

"Em uma breve análise comparativa das eleições 2012 e 2016, os motivos das cassações se repetem e o aumento quantitativo de cassações pode ser atribuído ao amadurecimento da própria lei que se tornou conhecida dos legitimados para impugnar o registro e propor ações para cassar os registros ou diplomas, e o amadurecimento da própria jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e dos Regionais na aplicação da Lei das Inelegibilidades", explicou o desembargador.

O TRE-CE alega que a fiscalização para evitar os chamados ilícitos eleitorais, que acarreta na perda dos mandatos, depende de uma atuação conjunta da Justiça Eleitoral, Ministério Público, partidos políticos e a sociedade em geral, "uma vez que ações como compra de votos e o uso irregular da máquina pública se perfazem às escondidas, em acordos velados entre o comprador de voto e o beneficiário e não às escâncaras", diz o magistrado.

Ainda conforme o desembargador, o Tribunal vem realizando palestras e webeventos nos canais de YouTube e Instagram com a finalidade de levar aos partidos políticos e pré-candidatos os mais atuais rumos da jurisprudência bem como possibilitar o diálogo prévio com os atores do processo eleitoral de 2020.

"Em breve, realizaremos encontros específicos com os partidos para definir os limites relativos à propaganda eleitoral no Estado e definir estratégias conjuntas evitando o litígio", prometeu o presidente.

Pragmatismo

Para a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, Monalisa Torres, essa atuação conjunta no combate às irregularidades citadas pelo presidente da Corte, pelo menos em relação a uma parcela do eleitor, pode ficar comprometida.

Segundo a pesquisadora, o eleitor, em geral, escolhe os seus candidatos a partir de um ponto de vista muito pragmático. "Ele tem uma visão dos atores políticos como aquele que tem a obrigação de ajudá-lo quando precisa. É difícil para o eleitor médio, principalmente do interior, entender a troca de favores na política como algo irregular. Para ele não é apenas normal, como é a função do político", problematiza Torres.

O cenário de pandemia da Covid-19, com o uso de recursos sem a necessidade de licitação e com flexibilizações da Lei de Responsabilidade Fiscal, pode afetar ainda mais a conduta irregular de prefeitos, segundo a professora, tendo em vista que a maioria dos casos de perda de mandato nos últimos oito anos foi por abuso de poder político e econômico.

"As medidas são diversas: desde a ampliação de leitos nos hospitais, distribuição de medicamentos, vale-gás, vale refeição, um conjunto de medidas que garantem uma assistência às populações mais vulneráveis. E aí vem um desafio para os órgãos de fiscalizações para distinguir até que ponto essas práticas de mitigação da crise sanitária podem ser enquadradas ou não em crimes eleitorais", destaca a pesquisadora.

Alertas

Essa confusão no gerenciamento municipal dos gestores públicos pode render processos na Corte Eleitoral. Para a especialista em Direito Eleitoral, a advogada Raquel Machado, a grande quantidade dos casos por abuso de poder político chama atenção em relação à forma como esses prefeitos têm administrado as cidades.

"Quase a totalidade dos casos é por abuso de poder político. Uso da máquina pública para realizar a própria campanha. Os prefeitos que já estão no cargo precisam diferenciar a própria candidatura, ou a própria força política, do poder institucional do município", diz a especialista.

"Usar a máquina pública na própria campanha viola a impessoalidade e é um grande risco", alerta a especialista. "Nesse período, precisam ter cuidado com as informações que divulgam em canais oficiais da prefeitura e com as ações que realizam em nome do município", reforça.

Recorrência

Nos últimos quatro anos, o município de Tianguá, localizado a 310 km de Fortaleza, assistiu à cassação de duas chapas que assumiram a administração depois de 2016. A população acompanhou três eleições nos últimos quatro anos. O cenário traz insegurança ao eleitor.

De acordo com o músico Paulo Marcelo (23), morador da cidade, "o sentimento que fica disso tudo é de descrença com a política. Todos esses casos de corrupção, de cassação de mandato, cria uma instabilidade, um medo. Isso é ruim para a sociedade".

Ele diz que "as eleições e o debate político são de extrema importância para a democracia". "Você não sabe se o próximo candidato vai manter essa tradição de corrupção ou se vai ser uma renovação, mas a gente não pode deixar de acreditar na política", pontua.

Com informações Diário do Nordeste