Estão suspensas todas as consequências da emenda constitucional cearense que extinguiu o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), na última semana. A decisão é da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada pela Associação Nacional dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), na última terça-feira. Segundo a ministra, a decisão é "...Para suspender os efeitos da Emenda Constitucional n.87/2016, do Ceará, na sua integralidade, até novo exame a ser feito pelo insigne Relator, o Ministro Celso de Melo".
A Assembleia Legislativa do Ceará, ontem mesmo, por meio eletrônico, foi informada da decisão da presidente do Supremo. A petição inicial da ADI foi encaminhada também por via eletrônica, sob a alegação da pressa em ser proferida a decisão cautelar para evitar o fato consumado, inclusive com a distribuição dos processos de prestação de contas, que estavam com os conselheiros do TCM, para os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Todo o processo, porém, já havia sido feito na sessão da última terça-feira, no pleno do próprio TCM, pelos conselheiros do TCE.
Argumentos
Pela decisão liminar, até uma outra manifestação do ministro Celso de Melo, Relator, tudo continua como antes do processo de extinção do TCM. Os conselheiros deste Tribunal voltam a ter atividade normal e todos os atos praticados após a publicação da emenda constitucional estão inválidos. Ainda antes do fim do recesso do Poder Judiciário, quando o Supremo Tribunal voltar à normalidade, a Assembleia Legislativa do Ceará vai se manifestar sobre a liminar concedida.
A petição da ADI, assinada pelos advogados Cláudio Pereira de Sousa Neto e Beatriz Veríssimo de Sena, tem 57 laudas. Ela questiona basicamente o processo legislativo e sua rapidez para justificar a concessão da medida liminar, ao escrever que "em razão do rápido processo de desativação o Tribunal de Contas dos Municípios, é necessário deferimento da medida cautelar ainda durante o recesso, para que o processo não tenha se consumado por completo quando do final do recesso judiciário. Caso não seja deferida a liminar para suspender os efeitos da Emenda Constitucional Estadual nº 87/2016, o que se cogita apenas para argumentar, o posterior provimento da ação implicará em grandes custos para o Estado, que terá que reorganizar todo o aparato administrativo do Tribunal".
Em seguida, o texto diz que "o maior prejuízo, porém, será na confusão causada nos processos de prestação de contas em andamento. Uma vez remetidos ao TCE, os processos terão que ser revistos, reautuados e redistribuídos. As instruções já em curso também serão atrasadas, uma vez que serão reanalisadas no TCE".
Tramitação
A PEC foi apresentada pelo deputado Heitor Férrer (PSB) e outros logo no início de dezembro e, em aproximadamente duas semanas, foi votada em primeiro e segundo turnos. No mesmo dia da sua aprovação, foi promulgada e publicada no Diário Oficial do Estado. Este, também, é um ponto questionado pelos advogados. No dia seguinte à publicação da emenda, as primeiras providências eram adotadas para permitir que o Tribunal de Contas do Estado assumisse todas as competências do TCM.
Para os autores da ADI, "os artigos 60 e 64 da Constituição Federal não permitem que emendas constitucionais tramitem em regime de urgência, considerando a necessidade de amplo debate sobre as alterações a serem promovidas nas constituições. O lapso temporal entre a aprovação da emenda na Comissão de Constituição e Justiça e as votações em dois turnos foi de poucos minutos. Impossível supor que tenha ocorrido o indispensável debate sobre tão relevante alteração constitucional. Também sob esse aspecto é necessária a concessão da liminar".
E prosseguem: "Observe-se que não haverá qualquer prejuízo para o Estado se a medida liminar for concedida. O único efeito prático as Câmaras Municipais continuarão a contar com o auxílio do Tribunal de Contas Municipal para o exame das contas municipais, como vem ocorrendo há décadas no Estado do Ceará. A liminar sequer impedirá suposta economia de recursos, pois a Emenda Constitucional Estadual nº 87/2016 mantém a remuneração dos servidores do TCM".
Ao justificarem a concessão da medida cautelar, os advogados alegam que, se julgada constitucional a emenda aprovada pela Assembleia, "Tampouco se constata irreversibilidade no provimento. Se julgado improcedente o pedido, o Estado do Ceará poderá retomar, de imediato, os procedimentos administrativos para extinção do Tribunal de Contas Municipal".
Reações
Ao Diário do Nordeste, o conselheiro Domingos Filho, que costurou a ADI junto à Atricon, comemorou a decisão da ministra Cármen Lúcia diante do que considera uma ação "atropelada, inconstitucional e abusiva da Assembleia Legislativa".
Ele ressaltou que a medida cautelar da ministra suspendeu a emenda "na sua inteireza", o que anula a reestruturação das atribuições do TCM e do TCE. "Todos (os processos) estão nulos, completamente nulos. Eu estou tomando posse na próxima semana como presidente do TCM". Segundo ele, o presidente do TCM, conselheiro Francisco Aguiar, convocará a sessão de posse para o dia 6 de janeiro.
O autor da PEC, Heitor Férrer, por sua vez, disse que a decisão da ministra Cármen Lúcia foi "inesperada" para deputados favoráveis à extinção do TCM, uma vez que, conforme lembrou, o Supremo já havia considerado constitucional processo semelhante quando da extinção do TCM do Maranhão. "Não se esperava que o Supremo tomasse essa decisão", admitiu.
Fonte: Diário do Nordeste